O pornogrind é de todos: uma noite com os Serrabulho no Mavy

“O que raio é o pornogrind?”, é a pergunta que provavelmente está a ecoar na mente de quem decidiu aventurar-se neste artigo, escrito pelo vosso metaleiro de serviço. O universo do metal é uma autêntica selva de géneros e subgéneros, cada qual mais peculiar do que o outro e com nomes cada vez mais diversificados. Contudo, entre as estrelas mais excêntricas encontra-se o pornogrind, uma combinação que consegue, simultaneamente, surpreender e causar repulsa.

Para compreender o pornogrind, é necessário primeiro recuar às suas origens: o grindcore. Surgido no final dos anos 80, este subgénero trouxe uma avalanche de agressividade sonora ao universo do metal. Com batidas explosivas, riffs desenfreados e vocais guturais acompanhados de pig squeals, bandas como Napalm Death, Extreme Noise Terror e Repulsion assumiram-se como os porta-estandartes de um estilo tão caótico quanto fascinante. Apesar de serem nomes icónicos para fãs do underground, o grindcore permaneceu fiel ao seu estatuto de nicho. Os temas abordados eram frequentemente repletos de críticas sociais e políticas, com um tom anárquico e visceral, atraindo principalmente os anarco-punks de cristas audazes, ao som de muita distorção e muito tupa tupa na bateria.

No entanto, como em qualquer movimento, surgiram aqueles que quiseram desafiar o status quo, até mesmo dentro deste universo já tão radical. Foi assim que o pornogrind nasceu, como um primo rebelde e irreverente do grindcore. Ao contrário das mensagens sérias e contestatárias dos seus antecessores, o pornogrind substitui os manifestos políticos por letras absurdas e deliberadamente provocatórias. Em vez de lutas sociais, os temas oscilam entre o grotesco e o surreal: fezes, criaturas míticas e sexo (frequentemente misturados numa fórmula que poucos querem imaginar).

Se o grindcore era o grito de protesto de uma geração revoltada, o pornogrind é o seu primo irresponsável, aquele que surge alcoolizado, com um copo na mão e piadas impróprias debaixo da língua. Menos preocupado em educar e mais focado em desestabilizar, é como se dissesse ao mundo: “Vamos rir daquilo que é tabu, porque a vida já é suficientemente séria.” Uma espécie de sátira musical, com riffs esmagadores e blast beats que não deixam ninguém indiferente.

O pornogrind não só testa os limites da música extrema como também inverte completamente as regras não ditas do metal. Este género rejeita o elitismo típico dos sons mais pesados, acolhendo sem qualquer pudor elementos da música pop – ora de forma irónica, ora com genuíno apreço. Desde versões inesperadas de músicas mainstream a introduções que parecem saídas da rádio comercial, o pornogrind mistura o sagrado e o profano sem pedir autorização, criando algo que é ao mesmo tempo desconcertante e hilariante. Exemplos disso podem ser encontrados em bandas como Gutalax, com intros como “I’m always here”, enquanto atiram rolos de papel higiénico e confetis para uma multidão adornada com objetos insufláveis.

Mais do que isso: este subgénero aborda os concertos de uma forma completamente distinta. Enquanto o grindcore incentivava o caos em mosh pits intensos, o pornogrind transforma tudo numa celebração de proporções insanas. Dançar? Claro. Rir? Sempre. Beber? Nem se fala. Aqui, o humor e o absurdo têm tanto destaque quanto os arranjos pesados e os riffs ensurdecedores.

Se o cenário ideal para um concerto de grindcore é um bar escuro cheio de punks suados, o palco do pornogrind é bem mais excêntrico – imaginem um cubículo de WC, com os caixotes de dejetos a transbordar e uma orgia de pessoas vestidas de Pikachu a acontecer em pleno. Por mais estranho que pareça, esta imagem encapsula perfeitamente o espírito festivo deste género.

Entre os nomes que lideram este movimento estão bandas como Torsofuck, Cock and Ball Torture e Anal Blast, que personificam o ethos do pornogrind com uma discografia recheada de títulos e sons que desafiam qualquer convenção. É um género que se alimenta da sua própria estranheza, desafiando constantemente os limites e recordando-nos que, no final, a música pode ser também um espaço de loucura e irreverência total.

E em Portugal, será que há espaço para o pornogrind? Infelizmente, há pouco – e quem sabe, se houvesse mais, talvez fôssemos um país um pouco mais sorridente. No entanto, o que temos é suficiente para deixar marca. E a maior referência nacional do género é, sem dúvida, Serrabulho.

Os Serrabulho nasceram em 2011, em Vila Real, e vieram sacudir as convenções do metal nacional. Com Carlos Guerra como vocalista, Guilhermino Martins no baixo e Ivan Saraiva na bateria, o grupo conta também com músicos adicionais em atuações ao vivo, enriquecendo o espetáculo com instrumentos improváveis, como a gaita de foles. Desde 2013, quando lançaram o seu primeiro álbum, Ass Troubles, têm mantido uma produção consistente como uma verdadeira máquina de festa, somando quatro discos que exploram o lado mais ousado e divertido do género. Mas a sua influência não se limita ao território nacional: a banda já atuou em 21 países (ou pelo menos, assim dizem), em festivais como o Obscene Extreme na República Checa, o Santo Graal do género, o Resurrection Fest, em Espanha, e até no festival de techno, Balter Festival, no País de Gales. Os Serrabulho são uma banda extremamente trabalhadora que se recusa a cessar funções!

Os Serrabulho têm o dom de transformar qualquer palco numa experiência única, onde a única regra é divertirmo-nos. Não importa se és fã de metal ou apenas curioso: os seus espetáculos prometem arrancar gargalhadas e pôr toda a gente a mexer, e se estiveres a passar por um dia cinzento, os Serrabulho serão o remédio perfeito. Mesmo para quem não é fã dos tradicionais mosh pits, há alternativas: podes dançar à moda folclórica ao som de “Toco Loco Du Moi”, sentir o toque eletrónico de “Love Parade” ou até cantar com um sorriso no rosto o clássico rock “Sweet Grind of Mine”. Combinando humor, criatividade e uma boa dose de pig squeals, o grunhido característico do género, Serrabulho eleva a música a um patamar onde diversão e excentricidade reinam.

No último sábado (30), a banda regressou a Braga para um concerto no café-concerto Mavy, quase uma década depois da sua última passagem pela cidade. Vestidos de uma maneira que mais parece  resultado dum randomize na seleção outifts do Sims, apresentaram o seu disco lançado este ano, Piss & Love. O evento, embora mais contido do que os espetáculos habituais em festivais, foi uma verdadeira celebração. Tivemos circle pits animados, muita dança e até um ass of death – uma versão hilariante do wall of death, onde os participantes colidem com os seus traseiros, em vez de frente a frente. Pelo ar, voaram algodões de almofadas e a irreverência reinou com um peluche que, de início tranquilo a decorar o palco, acabou como estrela de atos… questionáveis. Durante mais de uma hora, Serrabulho trouxe energia, humor e clássicos ao palco, provando que, no reino do grind, não há festa como a deles. Pode dizer-se que, no universo Serrabulho, a irreverência nunca tira folga. Com tanta diversão e gargalhadas a preencher o ambiente, torna-se quase impossível recordar todas as músicas tocadas. Por serem tão curtas, parecia que tinham sido mais de mil! Ainda assim, deixamos aqui algumas sugestões do disco: “Anal La la la song”, “Grind e Grossa” e “Rest in Piss”.

O espetáculo foi uma surpresa para quem entrou no Café-Concerto RUM by Mavy sem saber o que estava prestes a acontecer. Entre riffs abrasivos e performances cheias de amor, os Serrabulho conseguiram arrancar reações de espanto e, quem sabe, até converter alguns curiosos ao mundo do metal mais excêntrico. Para os habituais frequentadores, a noite foi tudo menos previsível, mas é exatamente isso que define a essência da banda: quebrar barreiras e desafiar expectativas.

Num concerto dos Serrabulho, não importa se és fã de metal ou apenas alguém à procura de algo diferente para uma noite de sábado. Este é o espaço ideal para te expressares livremente, sem julgamentos e acima de tudo viver o Metal como foi feito para ser vivido, como bem entenderes!

Filho do rock, do doom e de todos os géneros musicais que nos façam abanar as ancas e a cabeça, reside em Braga onde estuda engenharia. Poderão encontrá-lo em qualquer cave onde haja barulho e em qualquer local onde haja cerveja a preços abaixo da média.

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