Bem contados são vinte. Ou melhor, sobram vinte. Alguns deste. Outros enviaste pelo correio. Outros até vendeste, ou pediste para deixar no balcão da loja. Outros perderam-se em mochilas, sacos, casacos, malas, porta-luvas, bancos traseiros de carros, comboios, cafés. Desses todos ficaram apenas vinte, bem alinhados no fundo do armário como se fossem contrabando.
Às vezes custa-te admitir que até te esqueces deles. Vais acumulando roupa e tralha diversa por cima, e só quando fazes a limpeza primaveril é que os descobres novamente. Só que nunca lhes pegas, nem sequer os mudas de lugar. Arrastas um bocadinho o monte para limpar a prateleira, e voltas a colocá-los cuidadosamente no mesmo sítio. Quem os visse ali, solitários e imponentes, brilhantes como no primeiro dia, quase que pensaria que eram bruxedo. Do género daqueles episódios de Twilight Zone em que a personagem principal tenta livrar-se de algo que lhe lembra o crime que cometeu, mas mal acaba de deitar o dito objecto ao lixo ele simplesmente volta a surgir tipo cogumelo.
Mas desta vez resolveste pegar neles. Sentas-te um bocadinho na cama, escolhes um e acaricias a capa ao de leve em jeito de relíquia familiar. O nome. O logo. O grafismo, tão pixelizado que te daria vergonha alheia se não fosse tão precioso. Na contracapa, as faixas. Dois números de contacto (ainda funcionariam?), um email. Os nomes. E as caras da foto, toda a gente tão novinha, toda a gente tão naive mas a fazer pose para parecer cool, para dar a sensação que já sabe tudo deste mundo e do outro.
Abres a caixa. O CD ainda lá está. Será que ainda toca? Hesitas por um segundo, mas cai-te logo a ficha do desapontamento quando te lembras que já nem tens deck de CD. Com um meio sorriso de resignação, voltas a fechar a caixa. Devolves ao molho que está em cima da cama, que por sua vez tornas a pôr na prateleira. De facto, são vinte. E vinte ficarão, eternamente condenados a olhar-te de forma desafiadora a cada vez que abres o armário. Para que nunca te esqueças de onde vieste.