Entreconversas: “como preparar um mergulho” com A Sul e MALVA

Nos passados dias 26 e 27 de setembro, A Sul e Malva tocaram no festival MIL, em Lisboa, na Lisa. Ambos os concertos foram minimalistas, compostos apenas por voz e guitarra, um pano de veludo vermelho e um holofote de cor amarela a iluminar o palco. Duas artistas que mal sabiam que aquilo que tinham em comum seria mais do que aquele palco.

Aqui na Playback, o nome Malva já é familiar. No ano passado, a nossa Ana Margarida Paiva entrevistou-a a propósito do seu primeiro e emotivo disco vens ou ficas (2023). Embora o projeto a solo de Carolina Viana (também 50% das redoma) seja recente, tem dado cartas um pouco por todo o país, consagrando-se como uma das cantautoras portuguesas mais excitantes do momento. O mesmo se pode dizer de Cláudia Sul que, a solo, se apresenta com o projeto A Sul.  A artista lisboeta é autora do EP Já Agora (2022), venceu o prémio Novos Talentos FNAC em 2023, e encontra-se, neste momento, a compor o seu primeiro disco, do qual já podemos escutar uma amostra, “Gin”, o seu mais recente e melancólico single.

Foi numa manhã de segunda-feira que juntei a capital e Cidade Invicta,  via Zoom, desafiando Carolina e Cláudia a entrevistarem-se uma à outra. Nesta conversa fluída e cheia de cumplicidade, Cláudia e Carolina partilham as suas experiências sobre compor um álbum sozinhas ou em colaboração, como é que as suas formações académicas influenciaram os seus projetos e ainda falaram de carpintaria.

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[Malva] Como é que preferes ser chamada? 

[A Sul] Cláudia. Às vezes acontece só Sul, porque está dentro de A Sul. E tu?

[Malva] Carolina. Também prefiro ser tratada pelo primeiro nome. Sinto-me mais humana. Malva não deixa de ser o projeto.

[A Sul] O nome Malva vem de onde?

[Malva] Vem de um livrinho de flores. Quando andava à procura de uma identidade, para não usar a minha, fui à biblioteca do meu pai e saquei de lá um livro e encontrei este nome. Depois descobri que, por acaso, era uma flor bastante comum, tanto na nossa zona como no país.

[A Sul] Bonito!

[Malva] Foi um encontro bonito.

[A Sul] E como é que é?

[Malva] Tem várias cores, umas pétalas frágeis, mas o melhor é ires ver.

[A Sul] Gosto do contexto.

[Malva] Na verdade, o nome da flor é malva rosa, mas rosa não me apetecia tanto.

[A Sul] Pensaste em rosa?

[Malva] No início até me passou pela cabeça ser Malva Rosa, mas não batia certo comigo.

[A Sul] Ok, estou a perceber. Não, Malva é esteticamente mais minimalista. Acho que tem mais potencial em termos visuais. Só Malva.

[Malva] E é prático, não é?

[A Sul] É prático e fica na cabeça… Malva!

[Malva] Por acaso também acho. Gosto das brincadeiras que fazem com o nome. Fala-me sobre o teu nome.

[A Sul] O meu nome é uma cena muito complexa: é o meu apelido.

[Malva] O teu apelido? Super fixe.

[A Sul] Gosto muito do meu apelido. Vem da parte do meu pai. Quando estava no processo de escolher um nome para um projeto, não queria colocar Cláudia Sul. Acho que é importante proteger o teu nome próprio. Gosto quando as pessoas fazem isso. Fica mais místico.

[Malva] Mas Cláudia Sul é bonito.

[A Sul] Obrigada. És Carolina quê?

[Malva] Viana, que é também a minha terra.

[A Sul] Já lá estive. A verdade é que as pessoas acabam por associar o apelido Sul ao Algarve, mas descobri há pouco tempo que Sul é uma terra perto de Viseu, zona onde a minha família paterna vive.

[Malva] Chama-se Sul?

[A Sul] Chama-se mesmo Sul. Parece que pessoas de outras gerações vieram dali. Não sei. Fica um mistério por resolver. Mas olha, já estive em Viana do Castelo e gostei muito. Fui lá em contexto do curso que estava a tirar em som para cinema e tínhamos de fazer um documentário. Aquilo chamava-se “Doc Nomads”, então juntava pessoas de todo o mundo que estavam a estudar cinema na cidade.

[A Sul] Conheces as pessoas e depois desenvolves uma ideia para um documentário, aproveitando o território.

[Malva] Então, tiraste cinema ou tiraste som relacionado com cinema?

[A Sul] Tirei som para cinema.

[Malva] Ok. Bonito. Não fazia ideia. Mas onde é que fizeste isso?

[A Sul]  Eu fiz na Lusófona, em Lisboa. O curso é Ciência de Tecnologia de Som.

[Malva] Uau!

[A Sul] Alicia-te fazer esse curso? 

[Malva] Completamente.

[A Sul] Ah, boa! Mas mesmo pela vertente de som ou pela vertente de cinema? 

[Malva] Pela vertente de som e cinema, sem dúvida. Aliás, curioso: eu fiz licenciatura em violoncelo, na ESMAE [Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo], no Porto. No fundo, a minha vida toda foi fazer música clássica. Quando acabei o décimo segundo, não sabia o que havia de fazer da minha vida, porque tinha estudado numa escola profissional de música e já tocava violoncelo desde o sétimo ano. Já estava um bocado angustiada com aquilo. No final do secundário, acho que nem me candidatei logo. Tirei um ano e não fiz nada. No ano seguinte, só me inscrevi para a ESMAE para violoncelo e para cinema. Foi um ou outro. Não entrei em cinema. Não tinha bases nenhumas. Aquilo foi só atirado ao ar, e fui para violoncelo. 

[A Sul] Mas estava ali o bichinho, se escolheste como opção.

[Malva] Sim, ainda está. Adorava, se bem que não tenho bases. 

[A Sul] Mas é por isso que há cursos. 

[Malva] Mas agora já não sei. Há-de ser noutra vida. Nesta vida, é complicado…Também gostava de ser carpinteira. [Risos]

[A Sul] Eu percebo perfeitamente, e dá imenso jeito. 

[Malva] Precisas de uma mesa? Eu faço-te a mesa. 

[A Sul] Não vais comprar uma mesa e a madeira t

[Malva] Não, eu ia mentir. Ia dizer que a única coisa que fiz foi um suporte para rolos de papel higiénico [risos]. Quer dizer, acho que não foi a única coisa, mas esse é o trabalho de que mais me orgulho. A base é uma rodela de uma árvore, estás a ver? Um lixo de árvore. E depois encaixa em cima um pauzinho que tem duas ramificações cortadas. O papel higiénico assenta numa das ramificações. Esse suporte está na casa do meu pai.

[A Sul] Incrível! Mas de onde é que vem essa vontade de fazer carpintaria?

[Malva] Estás a apontar? 

[A Sul] Não, estou a rabiscar. Gosto de ir desenhando.

[Malva] Pensava que estavas a fazer uma lista de tarefas…

[A Sul] Exato! Fazer o suporte do papel higiénico… [Risos]

[Malva] Quanto à carpintaria, não faço ideia. Simplesmente gosto de fazer coisas com as mãos e chateia-me não fazer, até porque agora não faço nada. Não sei. São coisas que aparecem simplesmente cá dentro.

[A Sul] Isso lembra-me uma coisa, e agora virando para o teu projeto: tu preferes escrever as letras num caderno ou escreves no digital?

[Malva] Se há coisa que acho que mais me define é não ter método. Acho que faço uma coisa e faço outra. Já escrevi em computador, mas é mais para redoma, que envolve… mais calhamaço. É um projeto  mais virado para o spoken word e para o hip-hop e, por isso, os textos costumam ser mais longos e às vezes batalho um bocado mais com eles. Por isso, calha ser no computador, mas também é raro. Normalmente escrevo no bloco de notas do telemóvel.

[A Sul] És tu que escreves para os dois projetos?

[Malva] Sou. E tu tens método? Sinto que tu tens método…

[A Sul] Não, gosto de ter um bloquinho de notas comigo. Aquele clássico bloco preto, sem linhas, que serve ainda para eu desenhar. Então vai tudo.

[Malva] Tu pareces ter aqueles cadernos mesmo bonitos.

[A Sul] Não, tem imensos rabiscos. Gosto de ter um caderno comigo. O importante é registar de alguma forma, porque às vezes aparecem aquelas frases-chave que encaixam perfeitamente.

[Malva] Sim!

[A Sul] Sinto que a escrita é um grande forte teu.

[Malva] Também acho [risos]. Não é que seja boa, mas se eu escolhesse a parte mais forte seria a escrita. Apesar de estar a aprender em todos os campos, diria que ainda tenho muito a explorar a nível de sonoridade. E na parte da escrita, sou até bastante flexível. Eu também gosto muito de como tu escreves.

[A Sul] A sério? Fico contente. Sinto que a escrita não é de todo o meu forte.

[Malva] Mas acho que dá para dizer tudo. É preciso encontrar o tom. Acho que tu encontraste um bom tom para dizer aquilo que queres dizer.

[A Sul] Ah, obrigada! Por acaso, estive a ouvir as tuas canções.

[Malva] Estiveste a fazer o trabalho de casa, não é? Claro! [Risos]

[A Sul] Era cedo e pensei: já que vou falar com ela, vou ouvir o álbum. Foi muito terapêutico. Fiquei deitada a ouvir. Foi bem fixe. As letras são muito boas…Tu escreves há muito tempo?

[Malva] Não sei. Escrevo desde a adolescência, mas em prosa. A escrita foi sempre suscitada por um estímulo exterior. Por exemplo, um concurso qualquer de composições. Mas sempre foi por estímulos porque eu sou preguiçosa.

[A Sul] Percebo perfeitamente.

[Malva] Quando há um concurso eu penso: ok, vou ganhar isto. Acabou. E pow! Ganhei.

[A Sul] Mas isso acontece por causa do compromisso e de teres um prazo, não é?

[Malva] Sim, é um… “Bora lá. Eu consigo”. Também no sétimo ano, onde ainda por cima tinha começado a estudar música, queria imenso escrever canções. Era péssima, mas só tentei uma vez. Ou seja, isto é oito ou oitenta. Não estou com vontade? Acabou. Não pego mais nisto. E acho que por causa disso fui-me convencendo sempre que não era capaz de o fazer. Por isso, é que só comecei a fazer isto há três anos, aliás só escrevo canções há um ano. Antes escrevia apenas por cima dos beats da Joana Rodrigues.

[A Sul] Então é a Joana que faz os beats?

[Malva] É a minha amiga, sim.

[A Sul] Que é do projeto redoma?

[Malva] Exatamente. Somos mesmo só as duas, e tenho sempre de frisar esta questão porque a malta acha sempre que há um homem envolvido. “Mas quem é que produziu?” Foi a Joana, malta!

[A Sul] Epá, não percebo isso…

[Malva] É uma panca….

[A Sul] Sim, o produtor tem de ser sempre um homem.

[Malva] É chato. E tu, produzes?

[A Sul] Sim, produzo. É a parte que mais gosto.

[Malva] Pois, ainda por cima está ligado com o que tu estudaste…

[A Sul] Tem tudo a ver porque habituei-me a fazer montagem de som para filmes. Para mim, é mesmo natural pensar na produção da música. Por exemplo: qual é o ambiente sonoro que quero aqui? Dá-me imenso gosto!

[Malva] Qual é o programa que tu usas agora?

[A Sul] [Risos] É o Pro Tools. Mas dá para utilizar para muitas outras coisas. Dá para música mas também para cinema.

[Malva] Tu és super pro de certeza. Pro Tools. [Risos]

[A Sul] Não, mas Pro Tools é a minha praia. Adoro editar.

[Malva] Maravilha. E és tu que produzes as tuas malhas?

[A Sul] Sim.

[Malva] E há pouco tempo lançaste um videoclipe. Foste tu que realizaste?

[A Sul] Esse último não fui eu. Dou sempre uma visão: “Gostava que o vídeo tivesse esta sensação, de ver estas cores, que fosse mais estático, com mais movimento”. Depois entrego, neste caso aos meus amigos, que estão ligados ao cinema e à fotografia, acabando tudo por fluir.

[Malva] Não queres fazer os teus próprios vídeos? Não te sentes capaz ou queres partilhar momentos?

[A Sul] Sinto que o meu forte é saber o que quero ver no vídeo. Tenho alguma visão, mas toda a parte de responsabilizar-me, de realizar até o vídeo estar feito, não. Por isso, gosto de entregar.

[Malva] Sentes que ainda não tens as ferramentas para concretizar as tuas ideias?

[A Sul] Acho que tenho as ideias, só tenho a parte mais metódica. Sabes? Pensar no guião, pensar em storyboard e assim. Gosto de passar a bola para o outro lado, porque os meus amigos são muito talentosos e enquadram-se com a minha visão.

[Malva] Estás a ir por um bom caminho. A tua parte visual é lindíssima.

[A Sul] Obrigada!

[Malva] Faz todo sentido perceber que é de onde tu vens.

[A Sul] E no cinema tens uma caixinha de referências para a vida. É uma batota que temos para sempre.

[Malva] Gostava de ter um pouco mais de atenção a essa parte, mas depois-

[A Sul] É uma questão de colaborar. Também posso te apresentar os meus amigos, ou pensarmos em conjunto. Era giro!

[Malva] Eu alinho. Agora, por acaso, não sei quando é que vai ser, mas futuramente, era bonito pensar nisso.

[A Sul] Para mim, a parte visual é muito importante num projeto. É mesmo criar aquele mundo, aquele ambiente visual.

[Malva] É preparar um mergulho. Se não, estás só a bater com a cabeça num chão de cimento, não é?

[A Sul] [Risos] Gostei imenso dessa expressão.

[Malva] É a punch line desta entrevista. Preparar um mergulho, viram? O que querem mais de nós?

[A Sul] Tu disseste que a tua formação foi em música clássica. De que forma é que isso te influenciou na música que fazes agora?

[Malva] Acho que continuo a descobrir como me influenciou. Em primeiro lugar, a nível de libertação. Fui privada muitos anos de explorar certas vertentes musicais e de improvisação para interpretar artistas mortos, que é uma coisa pesada. A escola era muito rigorosa e super precisa, e isso traz muitas coisas boas, mas também traz coisas más. As boas que a música clássica me trouxe é a disciplina, se bem que eu já a perdi [risos]. Porque, durante muitos anos, era mesmo muito rigoroso. A música clássica trouxe também o perfeccionismo constante a nível de técnica. Isso ainda guardo, mas cada vez mais brinco com isso e comecei a apreciar imenso a imperfeição e a sujidade. Gosto que isso também transpareça nas minhas gravações. Por exemplo, o deslizar da guitarra, um pequeno toque que eu sei que por acaso até fiz porque me distraí com qualquer coisa. Se calhar posso só ser eu a reconhecer, mas está ali.

[A Sul] Faz muita diferença.

[Malva] Acho que me deu alguma bagagem de linhas melódicas, assim como me ajudou a não ir pelo caminho mais previsível. Isto tem a ver com ter tocado muita coisa mesmo. Fiz imenso repertório durante anos. É tudo extremamente complexo, nada previsível e são histórias absolutamente densas.

[A Sul] A tua formação também serviu para perceber o que é que não serve para ti.

[Malva] Exatamente. É sempre engraçado ver o choque na cara das pessoas quando digo que a minha licenciatura é em violoncelo clássico.

[A Sul] [Risos]

[Malva] Porque não tem nada haver com o que faço hoje em dia, ainda mais quando só me apresentava em redoma.

[A Sul] E tu já tocaste violoncelo nas tuas produções?

[Malva] Sim, e cada vez mais pretendo fazê-lo. Em toda a minha vida tive uma relação de amor-ódio com o violoncelo, ainda para mais tive um período em que o pus de lado, principalmente quando fiz o recital final. Tenho cada vez mais trazido o violoncelo porque estou a fazer as pazes com ele e é uma mais-valia. E é isso que estou a tentar fazer agora um bocado, tanto em redoma como em Malva, se bem que tem a sua dificuldade. Fica aqui o convite para uma gravação de violoncelo, se quiseres.

[A Sul] Fica aqui registado.

[Malva] Faz o teu rabisquinho. [Risos]

[A Sul] Primeiro e prioridade: fazer suporte de papel higiênico em madeira. Segundo: convidar a Malva. Pronto.

[Malva] O que é que tu fazes no teu dia-a-dia? Estás a trabalhar para cinema ou nas tuas músicas?

[A Sul] Sou freelancer de som e música, e acho que nunca estive tão satisfeita com o que faço. Só que tem este lado instável, que é um bocado complicado de gerir. Estou a editar música para outros projetos. Por exemplo: misturei o EP Não Me Peças Mais Canções da Catarina Branco. Por acaso estou a representar a Catarina com a merch dela. [Risos]

[Malva] Adoro essa t-shirt!

[A Sul] Espero que tenha muito sucesso.

[Malva] Mas produziste o EP ou fizeste outra coisa?

[A Sul] Não, ela produziu. A ideia do EP é mesmo bonita. É disco em cancioneiro, um género musical que faz parte da infância dela, vindo dos pais que são enfermeiros, mas fazem parte de uma banda onde cantam estas canções. A Catarina [Branco] deu-me apoio para poder dar um novo som a estas músicas, para homenagear aquela banda. Foi bonito. Cada vez gosto mais do lado da mistura e é sempre um caminho longo até conseguires misturar bem. É uma vida inteira, mas dá-me muito gosto de ter essas oportunidades.

[Malva] Mas quando dizes editar, é fazer o quê?

[A Sul] Agora estou a trabalhar no Estúdio Vale de Lobos. Conheces?

[Malva] Sim.

[A Sul] Às vezes faço trabalhos para eles. Por exemplo, eles entregam-me a sessão de gravação com a banda e eu tenho de acertar a bateria com o baixo, a guitarra com o piano, para tudo soar harmonioso. Depois entrego novamente para eles misturarem.

[Malva] Ok. Tu estás a chamar-lhe de edição, mas porque é que não lhe chamas de produção? Porque não estás a fazer de raiz?

[A Sul] Não, porque acho que o meu trabalho ali não é criativo, apesar de gostar disso. É mais uma questão técnica de estar tudo a soar bem. É só uma cirurgia que vai antes da mistura.

[Malva] É o que tu mais gostas de fazer?

[A Sul] Como profissional de técnica de som, sim. No entanto, o que gosto mais de fazer é explorar o som, fazer montagens sonoras, produzir as canções. Estás a cozinhar e estás a montar uma história através do som.

[Malva] E agora só quero saber aquela pergunta básica que tem de ser feita: estás a preparar novas canções? [Risos]

[Malva] Não, agora estou curiosa. Aliás, já ouvi coisas tuas, só não tenho a certeza se é um EP, se é um álbum ou se são singles. O que é que já saiu?

[A Sul] Então, eu lancei o EP Já Agora em 2022 e agora lancei uma música sozinha que é a “Gin”.

[Malva] OK. Está organizada.

[A Sul] É isso que tenho. E tu é o álbum?

[Malva] Eu é um álbum [vens ou ficas]. Foi logo assim: pow! Agora ando a cumprir um bocado mais aquela lógica – “vamos dar uns minutos para começar a criar hype” – mas também calma. Tem de fazer sentido. 

[A Sul] Também acho. Acho que não há grande regra. Quando lancei o EP, também fui um bocado criticada, no bom sentido. Lancei uma música um mês antes, depois lancei o EP todo no verão, no dia do festival Super Bock Super Rock, que supostamente não se faz, e as pessoas disseram: “O quê, Cláudia? Que crime!” Na altura não fazia a mínima ideia dessa dinâmica, porque o EP para mim fazia sentido sair ou na primavera ou no verão. Este disco é bom para essas estações. Zero estratégias.

[Malva] Mas se reparares, agora é carradas de músicas a sair em setembro. E atenção, agora é só lançamentos até finais de novembro, porque dezembro também é proibido. Em dezembro não pode ser.

[A Sul] Esses calendários são lixados. Temos de nos adaptar a esse processo. Acho que conseguimos fazer sempre dentro das normas e de forma a que me faça sentido. Não ir atrás de tudo, só pegar em pequenas coisas que posso implementar aqui e ali.

[Malva] É isso! Estou a encontrar também um equilíbrio, mas eu gosto de encontrar estas simbologias que vou lançar ou porque é a data de qualquer coisa ou porque é um aniversário qualquer.

[A Sul] É o mais bonito, mesmo. É que faz parte também do que estás a publicar. E tu?

[Malva] Tu não disseste se estavas a preparar ou não! [Risos]

[A Sul] [Risos] Pois não. Ando a preparar e ando a escrever. Se tudo correr bem, ainda sai uma música este ano. Ando a fazer um disco e estou a adorar. É uma porrada emocional. Tem sido muito duro. Terapêutico. Mas todo o processo está a valer.

[Malva] É mesmo bom. Estás a fazer sozinha ainda?

[A Sul] Já abri o leque, ou seja, a parte de escrever as canções foi sempre um bocado na minha bolha, mas já gravei instrumentos com outros músicos. Fiquei bem contente. Não tive tanto esse lado no EP, foi mais do género: ah, não vou mostrar a ninguém-

[Malva] Conheço totalmente esse processo. De certa forma, estou a passar pelo mesmo. Comecei para dentro. Fiz o meu álbum no quarto e não mostrei a ninguém até sair, e isso é mesmo gratificante e foi assim que expus a coisa. Foi meio egocêntrico, mas foi uma necessidade que fez sentido. E agora já que o disco está aí e há oportunidade de continuar a fazer coisas, é um bocado olhar para fora e absorver também o que as outras pessoas nos podem dar.

[A Sul] É isso. São mais pessoas a pensar na tua música, por isso só pode melhorar. Mas reconheço que é um processo.

[Malva] Era o que eu ia dizer, porque ainda não entrei exatamente na zona de convidar músicos instrumentistas. O que está a acontecer agora é ter convidado certas pessoas para virem cantar comigo algumas canções. Por exemplo, já fiz uma música com uma pessoa que ainda não posso revelar o nome [risos]. Acho que futuramente gostava de criar ainda mais este espaço de partilha também. Tu apresentas-te sozinha no palco, não é?

[A Sul] Apresento-me sozinha e em banda.

[Malva] Não te vi sozinha ao vivo, mas já te vi com banda.

[A Sul] E são coisas muito diferentes. Em banda, sinto que consigo entregar as músicas que fiz de forma mais sincera, porque estão todas aquelas camadas, instrumentos e assim. Mas, também gosto muito de tocar a solo pelo lado mais minimalista e simples, só à voz e guitarra.

[Malva] Acho isso super corajoso. Não tenho coragem. Estou sempre com o meu apêndice, que é a Catarina Estácio que toca comigo. Foi eu que gravei as músicas, foi eu que as fiz, mas não sou capaz de as tocar e cantar ao mesmo tempo. Gostava de o fazer, mas não consigo ainda.

[A Sul] Idealmente, gostava de focar-me em cantar, porque é complicado. Em termos de concerto, o que me deixa mais nervosa é gerir o concerto. É ir falando e apresentando. Sinto que é uma grande responsabilidade estar a tocar, a cantar e estar satisfeita com os dois. Por isso, a minha responsabilidade é a interpretação e a voz.

[Malva] O meu perfeccionismo clássico, erudito, não me permite. Até porque eu tenho na cabeça que não sou guitarrista, mas sim violoncelista. Tenho dificuldades em decorar o nome das cordas soltas da guitarra. Se me perguntarem agora eu sei que as das pontas são MI. De resto, não consigo.

[A Sul] Acertaste. [Risos]

[Malva] Obrigada, mas mais do que isto, é mesmo complicado.

[A Sul] E concerto de violoncelo e voz?

[Malva] Isso é outro pedregulho.

[A Sul] Isso era lindo!

[Malva] Sofri muito nas minhas audições de violoncelo e recitais porque aquilo mexia-me mesmo forte com a minha ansiedade. Nunca imaginei voltar a pisar um palco. De repente, percebi que me sinto muito mais confortável com o micro à frente. O violoncelo também vai ser um processo. Já fiz uma vez para a rádio SBSR. Levei o violoncelo, cantei ao mesmo tempo e foi fixe, mas foi só numa malha. Uma tentativa.

[A Sul] Estou a ver potencial!

[Malva] Talvez. Vou pensar nisso. Para mim tem de ser com muita calminha.

[A Sul] Para mim, começou a ser mais natural a partir do momento em que comecei a ensaiar com uma banda. Como já os conheço e já são meus amigos, é natural. Sentia que precisava de uma bateria como deve ser para as canções, e ainda bem que o fiz, porque não quero voltar aos loops do Logic.

[Malva] Isso é uma coisa que nunca fiz. Nunca tive uma banda a sério. A minha banda é a minha amiga Joana no computador, ou sou eu sozinha e depois convido Catarina para tocar. Não sei se algum dia vou passar por aí, mas é um processo.

[A Sul] Claro.

[Malva] Aprendeste a tocar guitarra sozinha?

[A Sul] Sim. Quer dizer, tive aulas com o meu primo mais velho que me ajudou a dar os primeiros toques de guitarra. Lembro-me de tocar as “Dunas”. [Risos] Quando comecei a apresentar o projeto, achei que me faria bem ter a minha mão de guitarra treinada, mesmo pela questão técnica de ter estamina para conseguir dar um concerto e estar confortável. Depois tive aulas e adorei. Atualmente, já não tenho tempo. Tive aulas durante um período pequeno, mas fez toda a diferença porque me deu muita disciplina em tocar com os dedos certos. Levava imenso na cabeça do meu professor quando fazia bem acordes, mas não estava a usar os dedos certos. Deu-me disciplina. Gostava de voltar a ter aulas de guitarra.

[Malva] Acho que fazes muito bem e é importante.

[A Sul] É muito importante, fogo. Se tocar sozinha, tenho que fazer aquilo minimamente bem. Não é parar a meio do concerto e desistir. Sei lá.

[Malva] Acho que é muito bonito da tua parte teres essa responsabilidade para quem está à tua frente.

[A Sul] Não é que seja exímia, mas há um mínimo. Acho que faz parte da responsabilidade, como dizes, de dar um concerto. Tens de ter atenção a alguns pontos, e esse ponto técnico acho que tem que estar lá.

A Sul toca este sábado (12) em Vila Real, no Espaço Miguel Torga, pelas 18h. A entrada é livre.

Matilde Inês é uma pessoa que se emociona com os pequenos pormenores. É mais provável ouvimo-la a cantar as back vocals ou solos de guitarra, do que a letra principal. Recém licenciada em Ciências da Comunicação e que, atualmente, trabalha como radialista e jornalista na Rádio Voz de Alenquer. De vez em quando, escreve aqui e ali sobre música.
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Difícil definir se foi uma conversa ou uma sessão de terapia.

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