2024 é o ano das pop girlies e nós não poderíamos estar mais felizes e entusiasmades, não fosse a Playback “poptimista”. Como a nossa querida editora Ana Leorne escreveu no último editorial, “a verdade é que não só levamos a pop a sério como lhe damos um destaque excecional”. Ainda nem a meio do ano vamos e já nos chegaram aos ouvidos, por exemplo, os mais recentes discos de Ariana Grande (eternal sunshine), Beyoncé (COWBOY CARTER), Taylor Swift (THE TORTURED POETS DEPARTMENT) e Billie Eilish (HIT ME HARD AND SOFT).
Contudo, para esta edição, trago-vos Radical Optimism, o novo álbum de Dua Lipa, editado no passado dia 3 de maio. Contas feitas, este é indiscutivelmente um dos lançamentos do ano. Se há alguém que nos faz derramar umas quantas lágrimas e, ao mesmo tempo, dançar como se não houvesse amanhã, é Dua Lipa – ora revivam a magia de Dua Lipa (2017) e Future Nostalgia (2020). Não só é mestre no que diz respeito a falar sobre amores e desamores, usando o empoderamento feminino como fio condutor, como também é mestre a servir-nos caldeirões de sonoridades, onde cabe tudo e mais alguma coisa, dando geralmente origem a irresistíveis poções. Radical Optimism não é exceção.
Ouço, por vezes, dizer que as canções de Dua Lipa são mais do mesmo. Confesso que eu própria já achei o mesmo até começar a olhar para e a sentir a música, de um modo geral, com mais alma e coração. Não há que enganar, o dance pop e o electropop são os ingredientes indispensáveis – chamemos-lhe assim – no universo sonoro de Dua Lipa. Talvez por isso é que, para algumas pessoas, soe tudo muito igual. Mas, na verdade, basta-lhe para ser um êxito pop. No entanto, se há alguém que gosta de testar fórmulas diferentes é Dua Lipa, adicionando uma nova componente a cada trabalho que vai lançando. Atente-se: com um R&B à mistura no primeiro disco, uma fusão com o nu disco, o pop funk e o synthpop no segundo álbum e, neste terceiro, um mergulho profundo no pop psicadélico, escusado será dizer que tem vindo a funcionar tudo na perfeição. E, com este Radical Optimism, Dua Lipa continua a mostrar o que é pop a sério.
“End Of An Era” abre o disco com muita qualidade, com um beat minimalista mas altamente impactante e umas linhas de baixo funky. Não demora a sermos atraídos para o que vem a seguir, e claramente que o que vem a seguir não desilude. Sintetizadores sujos e linhas de baixo explosivas, que prometem incendiar qualquer pista de dança, aconchegam a voz de Dua Lipa que canta efusivamente “They say I come and I go / Tell me all the ways you need me / I’m not here for long / Catch me or I go Houdini”, um dos melhores refrões de sempre. “Training Season” segue o mesmo caminho, culminando num dos temas mais sensacionais do disco. Tanto se ouve influências dos icónicos ABBA, como de bandas mais contemporâneas como Tame Impala (o que não admira, dado que Kevin Parker é um dos produtores do disco) ou Parcels. Que bela fusão. Segue-se “These Walls”, recheada de ritmos tropicais e sintetizadores efervescentes, e uma linha de guitarra dreamy a surgir sorrateiramente, culminando num banger descontraído, enérgico e nostálgico, fazendo-nos, por segundos, esquecer que é uma das breakup songs mais angustiantes lançada nos últimos tempos.
Em “Whatcha Doing” e “French Exit”, a influência de Kevin Parker é fortemente sentida. Escutem aquele groove lento, melodioso e sedutor que empurra as canções junto com uma eletricidade que é impossível de resistir. Com estas duas faixas, Dua Lipa deu-nos um tempo para respirar, e que bom que o fez, porque mal nós sabíamos que precisávamos de tanto fôlego para “Illusion”. Destaca-se como uma das faixas mais dançáveis de todo o álbum, prometendo fazer parte da banda sonora deste verão que se avizinha.
Confesso, custou-me a perceber qual o tema que mais gostei neste disco (quer dizer, está tudo tão bom!), até que um dia o meu corpo manifestou-se e indicou-me a resposta: “Falling Forever”. Dispara num ritmo eurovisivo e épico, dando-nos uma vontade louca de gritar a bons pulmões “How long / How long / Can it just keep getting better? / Can we keep fallin’ forever? / How long / How long / Can we stay, like this, together? / Can we keep fallin’ forever?”. É berrar, então – assim fica a dica. “Anything For Love” vê o piano a surgir como um elemento considerável no primeiro minuto da canção, mas é imediatamente substituído por uma groove dançante, num torpor mid-tempo que confunde sentidos, culminando numa belíssima falsa balada. Tudo isto enquanto Dua Lipa se recusa a aceitar o ghosting nas relações modernas e a nova tendência que são as situationships. “Maria” faz transparecer uma vez mais uma estrutura vivamente acomodada em algo profundamente orelhudo e contagiante. Marcada por um riff inicial convidativo, esta canção dá as boas-vindas com uns acordes de guitarra polidos, aos quais se juntam um beat desenhado à medida e uns sintetizadores hipnotizantes. Contudo, o protagonismo recai sobre aquelas linhas ácidas que surgem entre o refrão (ainda não consegui superá-las). É com “Happy For You”, uma balada que, pelo meio, se eletrifica com contrastes sonoros enormes, que Radical Optimism termina – e não poderia terminar de melhor forma, isto porque transparece uma Dua Lipa muito mais madura e crescida. Na verdade, isto reflete-se por todo o álbum e é possivelmente por esta razão que este álbum ganhou um lugar tão especial no meu coração.
Enquanto nos dois primeiros discos presenciamos uma Dua Lipa, digamos que, mais impulsiva e dramática, em Radical Optimism escuta-se uma Dua Lipa mais consciente e otimista – o nome do disco não é por acaso. Uma Dua Lipa que não se deixa quebrar facilmente. O romance continua a ser a sua temática predominante, mas a perspetiva em torno dela é diferente e isso muda todos os contornos deste álbum. Quando estiverem a sofrer por amor, já sabem o que ouvir. Pode ter um efeito terapêutico.
É um disco fenomenal. É um disco pop na mais pura definição do termo. É um disco fiel ao seu autor. É de se ouvir, é de fruir. É uma brisa de verão.